§22.FONTES E FUNDAMENTOS INTERNACIONALISTAS E UNIONISTAS DO DIREITO ADMINISTRATIVO: NOMOLOGIA, PLURALIDADE DAS FONTES DE CRIAÇÃO DO DIREITO ADMINISTRATIVO
22.1. Considerações gerais
O direito administrativo, vigente na nossa ordem jurídica, é integrado, desde que Portugal pertence à União Europeia, não só por normas de produção nacional, mas também, em grande medida, por normas de direito internacional oriundos da Comunidade Internacional, de âmbito geral, regional ou bilateral, e de Direito Comunitário Europeu ou Direito da União Europeia, oriundo das Instituições Europeias (dotadas de poderes multimateriais de natureza para-estatal, que lhes foram afectadas por atribuição directa ou com base em cláusula de ampliação evolutiva), ou de instituições de organizações internacionais clássicas, dotadas de atribuições especificadas, criadas em Tratados, celebrados pelos Estados ou pela celebrados pela UE, e cuja aplicação, em caso de divergência reguladora, têm primazia sobre quaisquer normas de fonte nacional (princípio do primado do Direito Internacional e do Direito da União Europeia ou Direito Comunitário Europeu).
O Direito da União Europeia, salvo as normas sobre organização e poderes das instituições e de outros órgãos da União e normas sobre sociedades europeias e poucas mais, são, em geral, normas de direito administrativo, pelo que, pela sua importância e volume, a teoria das suas fontes é matéria extremamente importante no estudo quer do direito administrativo geral, quer de vários ramos de direito administrativo especial.
Sendo o Estado português um Estado unionista europeu, sujeito à nomogénese comunitária europeia, em processo «aberto» à contínua unificação europeia[1], não admira que se esteja face a matéria que as revisões constitucionais procuraram enquadrar nos n.º 6 do artigo 7.º e n.º 3 e 4 do artigo 8.º, e, tendo presente essa importância quantitativa e qualitativa, tanto em domínios substantivos como procedimentais e jurisdicionais, do direito administrativo oriundo das Instituições da União, é de interesse ministrar conceitos basilares sobre o tema[2], matéria a que passamos a referir-nos.
Com efeito, Portugal é membro da União Europeia, encontrando-se as suas autoridades legislativas e administrativas, enquanto Administração indirecta da União, obrigadas a aplicar o direito comunitário europeu.
Por isso, além da afirmação inicial da existência do primado do direito comunitário, designadamente dos princípios de direito administrativo geral, designadamente procedimental comunitário, sobre qualquer norma de direito interno, importa tecer algumas considerações gerais sobre a nomologia comunitária.
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Começamos por referir que também se integram neste direito de aplicação obrigatória por todas as entidades do Estado e cidadãos as normas de direito internacional, de aplicação ligada à cláusula da recepção plena, e também afastando a aplicação de normas de fonte nacional incompatíveis (princípio do monismo com primado do direito internacional e n.º 1º e 2.º do artigo 8.º da CRP).
Estas afirmações levam-nos a tratar, nesta altura, da nomologia administrativa, dado que, numa Administração nomocrática, subordinada não só aos legisladores internos mas também aos supra-nacionais e ao direito internacional, ganha grande importância a questão da identificação e hierarquização das fontes globais do direito administrativo que lhe é aplicável.
Vamos fazer breves referências quer ao DIP e especialmente ao jus cogens internacional quer ao direito da União Europeia (o direito originário: convencional, cuja fonte está nas normas dos tratados e, em breve, Tratado Único de Lisboa; o direito derivado: institucional, cuja fonte está em normas e actos jurídicos produzidos pelos órgãos cimeiros, de natureza para estatal, as chamadas Instituições da União; e o direito complementar: também convencional constante das normas de tratados celebrados pela União com estados terceiros, estritamente nos termos das Convenções de Viena do Direitos dos Tratados).
Depois, uma referência, em geral recapitulativa de matéria tida como dada noutras cadeiras, às normas da Constituição, desde as normas directamente aplicáveis e exequíveis por si mesmas; normas não exequíveis por si mesmas e normas programáticas), interpretação sobre o enquadramento do DIP em geral e do DUE (artigo 8.º da CRP), leis ordinárias de valor reforçado geral e específico, leis ordinárias, regulamentos estaduais (decreto regulamentar, resolução, portaria e despacho normativo, etc.) e infra-estaduais, costume, jurisprudência e doutrina.
22.2.TEORIA GERAL DAS FONTES DE DIREITO ADMINISTRATIVO
22.2.1. Considerações prévias sobre as fontes do direito administrativo
O direito administrativo tem, em geral, as mesmas espécies de fontes que a generalidade dos outros ramos do direito, aplicando-se-lhe os mesmos princípios que, cientificamente, se construam, em geral, em sede da teoria nomocrática.
Mas, tudo isto, sem prejuízo de, por um lado, como é frequente em outros sectores da normatividade, se dever constatar especialidades, com significado no regime das fontes (com influência no campo da determinação das normas aplicáveis e do sentido a atribuir-lhes).
E, por outro, depararmos aqui com tipos de fontes com especial importância, como acontece com os princípios de aplicação à actividade administrativa em geral, em gestão pública ou em gestão privada (direito privado administrativizado), hoje constitucionalizados.
Estes princípios assumem um mesmo valor jurídico, por força da lei e da existência de vastos poderes discricionários em muitas matérias).
E tem, mesmo, de se acrescentar a importância de certos tipos de fontes específicas, como acontece com as praxes administrativas e de práticas interpretativas correntes, não só obrigando à fundamentação das soluções deferentes como preenchendo a densificação da cláusula geral de autorização de poderes delegados em imediatos inferiores hierárquicos, adjuntos ou substitutos (n.º1 do artigo 35.º do CPA).
E não pode esquecer-se a especial quantidade e portanto importância da multiplicidade, por vezes escalonada, de regulamentos, mas também as directivas internas e pareceres ou recomendações, designadamente do Provedor de Justiça[3] e deliberações de Entidades Independentes[4].
Além disso, realce-se o facto de estarmos perante uma área do direito que vive não apenas de normas verticais, que tratam directamente matérias como o ambiente, directamente aplicáveis, em termos imperativos ou subsidiariamente, mas também de normas de direito judiciário e processual, o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais e Código de Processo nos Tribunais Administrativos, o que significa que, nos termos dos critérios distintivos tradicionais, é enformado por normas quer de natureza orgânica, quer substantivas, quer processuais, e cujas fontes e seus regimes jurídicos diversos adquirem relevo maior ou menor, mas que importa destacar e situar.
Vamos estudar primeiro, sinteticamente, a teoria geral das fontes de direito e depois apontaremos alguns diplomas fundamentais que se lhe referem e abordaremos o papel das outras fontes, sejam as internas (geradas no âmbito da comunidade nacional) sejam as comunitárias europeias e as internacionais (geradas no âmbito supranacional da União Europeia ou da sociedade internacional em geral).
22.2.2.TEORIA DAS FONTES DE DIREITO EM GERAL
A)- TEORIA CLÁSSICA E NEOCLÁSSICA
Na teoria clássica das fontes, vigente em Portugal na maior parte do século XX, e cuja orientação aparece seguida no Código Civil de 1966, a fonte formal de direito era a lei (norma positiva) e a jurisprudência apenas a título excepcional, quando imposta por lei (os assentos, enquanto acórdãos uniformizadores da jurisprudência com impositividade prevista a partir de 1926), aparecendo o costume com força obrigatória dependente da lei, mas não se aceitando o costume autónomo, que se afirmasse por si mesmo (apesar de ser a fonte mais antiga e «genuína»[5]), nem a jurisprudência e a doutrina enquanto tais.
Com efeito, segundo o Código Civil (artigos 1.º a 4.º, com estatuições com pretensão nesta matéria, a assumir uma natureza materialmente constitucional; de regulação exclusiva das fontes), a principal fonte imediata era a lei e previam-se como fontes mediatas, dependente da vontade da lei (ou seja, existentes na medida em que do legislador lhe conferisse tal qualidade), os assentos, os usos e a equidade (apesar de não se compreender tal integração, pois esta não é fonte de factos normativos, mas apenas um modo de decisão meramente casuística, ou seja, recurso admissível, em certas situações, para casos individuais e concretos[6]).
B)- TEORIA GERAL ADOPTADA E POSIÇÃO SOBRE A QUESTÃO DAS FONTES DE DIREITO ADMINISTRATIVO, SUA HIERARQUIZAÇÃO E APLICAÇÃO PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Nesta matéria, remete-se para os conhecimentos já adquiridos na Introdução ao Estudo Direito ou em Princípios Gerais de Direito[7], limitando-nos antes a expor as questões específicas que se levantam ao nível da aplicação do direito administrativo, e onde há que tomar-se posição clara sobre a aplicação do direito pela Administração Pública, em que, em geral, as posições da doutrina portuguesa não nos têm merecido acolhimento, designadamente quanto às fontes do direito, à sua hierarquização e à aplicação pela Administração Pública.
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Os temas que consideramos de interesse desenvolver aos alunos de direito do ISCSP, sobre a teoria das fontes do direito e a sua hierarquia (em que se interligam considerações sobre a teoria da produção das fontes internas, das fontes de direito da União Europeia, das fontes de direito internacional e sua relativa ordenação global), podem ser ordenados do seguinte modo:
a)- noção de fontes do direito e a noção de norma jurídica; sentido jurídico-formal de fonte de direito; fontes de actos jurídicos em geral e fontes de normas jurídicas;
b)- tipologia das normas jurídicas: tipologia estrutural (regras e princípios; princípios generais do direito); tipologia formal das normas jurídicas (normas de tratados internacionais e unionistas, normas constitucionais, leis, regulamentos); classificação das normas jurídicas;
c)- teoria das fontes: teoria nacionalista positivista (clássica) das fontes e o CCV de 1946; teorias neoclássica pós-Constituição da República Portuguesa; reformulação da teoria das fontes imposta pela realidade político-social do país: teoria realista, pan-nomocrática, integradora de todas as fontes e segundo um escalonamento de hierarquização a todos os níveis, coerente com a ordenação relativa dos vários poderes, supra e intranacionais, que é a que corresponde à nossa posição tradicional e à doutrina pluralista das fontes expressa no Manual de Introdução ao Direito, de DIOGO FREITAS DO AMARAL[8]; questão da equidade e o artigo 4.º do CCV;
d)- princípio de hierarquia, ordenamento integral das várias fontes[9]e sua razão de ser.
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Quanto à noção de fonte, começo por referir que a palavra fonte é equivoca por ser multívoca, podendo atribuir-se-lhe vários sentidos, desde o sentido físico a sentidos metafísicos. Se de facto, no primeiro sentido, o vocábulo fonte é usado correntemente com um significado, o de nascente de água, já, em sentido figurado, é usado com sentidos mais extensos, normalmente, embora não só, à volta das ideias de causa, factor desencadeante, nascente ou origem de algo.
Em sentido figurado, mas próximo do literal, a aplicação do vocábulo fontes no âmbito do direito (fontes de direito, mesmo que um pouco forçada à realidade e ciência do direito) traduziria a ideia de factos de onde parte (origens, causas) o aparecimento de normas de conduta social consideradas como impositivas (com força jurídica), ou que as viabiliza ou que funcionam como circunstâncias que conformam as suas soluções concretas.
Ou seja, não são as normas em si, mas os vários tipos de factos (jurídicos) criadores destas[10], as organizações que a processam ou os factores que implicaram uma dada modelação concreta do seu conteúdo[11].
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Mas podemos falar de fonte de direito em vários sentidos:
a)- fonte radical (de radix, radicis, raiz), causal, a um tempo justificativa e aferidora da validade do direito, identificada com o Direito Natural ou Direito Racional, que sem necessidade de positivação seria fonte normal do direito e, mais do que fonte de direito, seria também fonte e medida de validade do direito positivo;
b)- fonte explicitadora do direito (material, explicativa ou fonte iuris cognoscendi), para referir a fonte do conhecimento do direito; e
c)- fonte expositiva (ou fonte iuris essendi), para significar as normas (o direito exposto, normas que se expõem) em sentido directamente normativo: as normas de conduta e de produção dessas mesmas normas comportamentais (ou normas primárias e secundárias, na construção de H. Hart)[12].
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A expressão fontes de direito é usada na teoria do direito em sentido formal, como as maneiras através das quais se efectiva, independentemente das suas modalidades, o aparecimento escrito ou oral (criação ou revelação) de normas com força jurídica.
Portanto refere-se quer às fontes produtoras de factos normativos (quanto ao direito de origem estadual, -e sem prejuízo de outros centros estaduais não oficiais ou supra e infra-estaduais, públicos ou particulares, geradores de normas jurídicas-, o direito estadual oficial nasce dos poderes legislativo, executivo e jurisdicional do Estado), criadores, modificadores ou extintores de normas (actos normativos legislativos, administrativos e jurisdicionais; fontes constitutivas de direito, modos de o produzir, fontes juris essendi,[13]), quer às fontes reveladas, que permitem aceder ao conhecimento do direito complementando (adicionando, suprindo, corrigindo ou modificando) os factos normativos produtores deste (factos de natureza diversa, como a doutrina, as regras de ciência ou de arte, ou mesmo factos normativos de natureza interpretativa: fontes declarativas, reveladoras, modos de o conhecer, fontes juris cognoscendi[14].
Quanto às teses sobre as fontes, constata-se que, na literatura nacional, temos, de um lado, as tradicionais teses clássicas, que rejeitamos, e, do outro, a tese realista (que sempre perfilhámos, nas várias disciplinas em que tivemos de expor sobre fontes, designadamente nas cadeiras de direito comunitário, direito internacional público, direito da comunicação social e direito administrativo, e que, recentemente, aparece bastante desenvolvida e fundamentada, em termos muito semelhantes, por DIOGO FREITAS DO AMARAL, no seu Manual de Introdução ao Direito).
Não podemos deixar de nos demarcarmos de teses neoclássicas, em posturas em que se reconhecem progressos de base teórica, mas que, ficando sempre a meio caminho, entre novos princípios e dados políticos, que se aceitam em face da realidade, para a qual se mostra sensibilidade, mas dos quais não se tiram todas as consequências, e, portanto, imprimindo avanços relativos em simultâneo coma a manutenção, em parte, de soluções tradicionais, com conclusões «à la carte» (que lhes introduz toda uma incoerência científica), de que os próprios não conseguem deixar de se admirar e lamentar.
Mesmo que os propósitos afirmados parecem diferentes, em geral, acabamos realmente por nos deparar perante construções globais incoerentes, que só aparentemente poderiam fugir a uma integração no rol de teses neoclássicas, dado que se situam mais numa postura de racionalização de parte do status quo e, portanto, de conformação com as práticas ou na maior parte continuando presas às bases e premissas de reflexão das doutrinas correntes, de que não conseguem afastar-se (por vezes, afirmando o direito a partir de textos e dogmas não jurídicos, mesmo que respeitáveis), até chegarem, finalmente, em sede de antinomias jurídicas a concluir, em sede de regras de hierarquização aplicativa das normas, que as cientificamente válidas o são apenas para os tribunais, mas não para a Administração Pública, ou seja, que a Administração Pública deve aplicar um direito diferente do dos tribunais e, portanto, também daquele a que estão sujeitos os administrados, numa construção dual, pretensamente científica, em que o direito poderia, ao mesmo tempo, ser e não ser, pois que o cidadão, em caso de conflito de normas ou de sucessão de normas ou de cumulação de normas de poderes diferentes, não poderia deixar de procurar reger-se pela norma que deve ser aplicável[15], mas em que a Administração Pública teria que aplicar normas diferentes realmente e não aplicáveis[16], porque pautando-se essencialmente pelo princípio lex posterior ou, quando muito, lex specialis, com desprezo em geral da supremacia da norma constitucional, do DIP e do DUE, para que caiba depois aos tribunais, nos poucos casos que aí vão parar, intervirem para repor a verdadeira legalidade, aplicando as normas que devem ser cientificamente aplicáveis[17]-[18].
Será que é aceitável que os princípios da primazia de normas de direito internacional e comunitárias sobre todo o direito de fonte interna e das constitucionais em relação às outras que destas dependem, pode ter um valor relativo para a Administração Pública, a decidir cientificamente «a la carte», e com um regime diferente do aplicável aos cidadãos e tribunais, que está obrigada ou habilitada a aplicar normas infra-ordenadas com elas incompatíveis?
A minha posição, comungando embora das precauções de JORGE MIRANDA e na linha das posições de princípio de Freitas do Amaral, é a de que a juridicidade que a Administração está obrigada a respeitar, inclui em geral as próprias normas supranacionais[19] e as normas constitucionais, todas elas parte do bloco da normatividade enquanto vigentes, e dotadas de supremacia normadora, embora, quanto à Constituição da República Portuguesa, só em casos de inconstitucionalidade material com uma desconformidade manifesta, especialmente em situações de unanimidade doutrinal sobre o tema, ou em que os tribunais, no controlo difuso ou concentrado, já tenham considerado alguma vez a norma infraconstitucional (pelo menos, recentemente, se se trata de tribunais comuns) como desconforme à Constituição, e desde que a questão seja colocada ao e resolvida pelo órgão máximo do ministério (ou de pessoa colectiva em causa), tudo sem prejuízo do direito normal de impugnação pelo destinatário, público ou privado, da decisão que não aplique a norma tida como inconstitucional, para o tribunal administrativo competente.
De qualquer modo, esclareça-se que o termo fonte de direito, será aqui usado, não no sentido corrente em direito comunitário, de modo de produção ou revelação de actos impositivos[20], mas de modos de produção (criam uma norma ou alteram e extinguem normas existente; carácter inovador, natureza constitutiva da norma) e de modos de revelação (dão a conhecer pela primeira vez, em si ou no seu conteúdo, direito pré-existente; sem carácter inovador, mas meramente declarativo) de uma parte desse actos, as normas jurídicas[21].
Dado que as fontes tanto se encontram numa relação de paridade (situação em que uma pode revogar as outras: caso do costume, lei e decreto-lei), como, na maior partes dos casos, em pé de desigualdade, numa relação de supra e infra-ordenação (em que a de valor infra-ordenado é inválida (nulidade, anulabilidade, ineficácia) se contraria a de nível superior, enquanto esta pode revoga aquela, ou seja, de hierarquia ou de ordenação vertical (por ordem de supremacia relativa, Direito Internacional Público, Direito da União Europeia, Constituição da República Portuguesa, Lei de Valor Reforçado, Lei Simples, Regulamento, etc.[22].).
DIOGO FREITAS DO AMARAL[23], criticando os constitucionalistas nacionalistas (e a desvalorização da norma supranacional, do DIP e do DUE, em face da Constituição da República Portuguesa, cujo «valor» e «significado» exageram), ordena as fontes da seguinte maneira:
No topo, coloca o Direito Internacional Público em geral (costume, tratado, princípios gerais, jurisprudência, etc.).
E isto, em face do princípio do seu primado, pese embora aos enunciados, designadamente em sede de fiscalização da constitucionalidade caracterizadores de uma Constituição que pretenderia amarrar-nos ao primado do direito interno, sendo certo que estas «cláusulas constitucionais ilegítimas à face do direito internacional», quer o princípio pacta sunt servanda, transcrito no artigo 26.º, quer o disposto no artigo 27.º da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, que constituem ius cogens e elas violam, pelo que são inválidas ou, pelo menos, ineficazes e como tal devem ser desaplicadas pelos nossos tribunais[24].
E quanto ao direito comunitário, afirma este autor, na linha do Manual de Direito Internacional, de ANDRÉ GONÇALVES PEREIRA e FAUSTO DE QUADROS e em correspondência com os nossos textos sobre a matéria, que o princípio do primado abrange todas as normas, designadamente as da Constituição da República Portuguesa, o que considera resolvido pelo novo n.º4 do artigo 8.º da Constituição da República Portuguesa, em face da Lei Constitucional n.º1/2004, de 24 de Julho., não tendo o inciso final qualquer interesse prático, porque a União Europeia é um espaço respeitador dos direitos fundamentais[25].
Em geral, teremos presente que, no desenvolvimento desta temática, é importante abordá-la, tendo em atenção as questões específicas que se levantam em relação à Administração Pública: o dever de obediência da Administração Pública à lei e o bloco da legalidade, ou seja, os princípios da constitucionalidade, da legalidade, o jus cogens internacional e o primado do Direito Comunitário.
22. 3. Fontes de direito administrativo
Iremos debruçar-nos sobre as principais e mais correntes, que interessam mais ao dia a dia do direito administrativo.
Não nos referiremos aqui nem aos contratos, que têm força normativa entre as partes, nem aos actos administrativos, que são decisões individuais e concretas proferidas unilateralmente pela Administração Pública que, também, a vinculam nos seus termos e da lei em face dos seus destinatários.
a)- Os princípios gerais de direito.
Em termos de princípios gerais de direito[26], aplicáveis no direito administrativo em geral, importa destacar sobretudo os consagrados na própria Constituição da República Portuguesa e Código do Procedimento Administrativo, sobretudo os princípios fundamentais de toda a actividade da Administração Pública, princípios gerais «da» actividade desenvolvida pela organização enquanto tal ou por quem, a qualquer título, desenvolva uma actividade considerada no âmbito da Função Administrativa do Estado-Comunidade, em que há que, desde já, começar por destacar não só os princípios da igualdade, imparcialidade, justiça, interdição de excesso, boa fé, legalidade positiva em geral e especialmente o do respeito pelas posições jurídicas subjectivas dos particulares -dos direitos e interesses legalmente protegidos- e princípios de natureza procedimental, também, pela sua importância fundamental neste campo, outros princípio de raiz constitucional, como os da ponderação de quaisquer interesses relevantes para a actividade decisória, da transparência no funcionamento da Administração pública (livre acesso aos documentos e informações detidos pelos serviços públicos, fora das excepções – que, aliás, apenas permitem o deferimento do seu conhecimento no tempo- ligadas à confidencialidade da vida íntima das pessoas e famílias, juízos de valor negativos sobre pessoas singulares, segredos de defesa nacional e de segurança interna sob prévia classificação governamental, segredo de justiça penal impostos pelos tribunais e, eventualmente, quando se justifique, matérias de natureza económica empresarial)[27], da garantia patrimonial (sujeita ao regime administrativo especial da responsabilização civil extra-contratual: actos ilícitos, dolosos ou negligentes –responsabilidade subjectiva, pela culpa individualizável, ou pela culpa dos serviços; actos resultantes de actividades perigosas- responsabilidade objectiva, pelo risco-; actos lícitos: legalmente previstos no interesse geral mas que criem sacrifícios apenas a alguns; desde que entre o acto e o dano produzido haja um nexo de causalidade adequada), matérias que cujo tratamento caberá na parte referente ao direito da actividade administrativa.
b)- O costume (supranacional ou interno)
c)-A Constituição, as leis e as restantes normas escritas («lei» em sentido amplo, no sentido de «bloco da legalidade»: quer a comummente designada como norma fundamental, texto positivo de impositividade interna, a Constituição, quer as verdadeiras leis, comummente designadas como «leis infra-constitucionais», quer e os regulamentos, quer as normas supranacionais (acordos internacionais e decisões normativas de instituições de âmbito supra-nacional): uma qualquer norma jurídica, originada numa manifestação de vontade impositiva de uma qualquer autoridade com competência para tal)[28]-[29].
d)-A jurisprudência e a doutrina. Seu valor como fontes produtoras ou reveladoras do jurídico. A importância do recurso à jurisprudência e doutrina, nacionais e estrangeiras.
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Começo por referir já uma noção perfunctória de costume, que justificarei e que se voltará posteriormente.
O costume não é uma fonte receptícia de direito, dado que a sua obrigatoriedade não provém do reconhecimento estabelecido positivamente por qualquer norma, de natureza constitucional, legal ou regulamentar, nas situações em que o legislador se «esqueceu» de criar uma norma adequada para a situação ou se demitiu de o fazer remetendo para o costume.
Ele existe por si independentemente da vontade do legislador representativo, de base directamente popular, sendo uma fonte espontânea do direito (fruto da autonomia privada, que não tem que ser reconhecida pelo Poder, porque, aliás, em democracia, é ela que reconhece o Poder).
Em tempos recuados, antes do aparecimento da lei, ele terá mesmo sido a fonte única do direito, tendo ela a partir de certo momento acompanhado o direito costumeiro.
Mas, por razões da sua quase instantaneidade de formação e necessidade de se afirmar a actividade legislativa como principal atributo do Poder político na Europa continental (não assim nos países anglo-saxónicos, em que continua a ser a principal fonte normativa), sujeita a períodos de grande mudança política e exigindo alterações normativas rápidas e a subalternização do papel dos tribunais conservadores, a lei viria a impor-se como fonte qualitativamente dominante e viu mesmo os dirigentes políticos procurarem anular ou subalternizar-lhe os costumes, que não só, quando anteriores, eram objecto de revogação, como, se posteriores, de uma pretensão de desvalor para não poderem ter efeito revogatório das leis.
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A teoria da vontade da doutrina tradicional apontava como requisitos fada existência de um costume com valor jurídico, o uso uniforme, frequente e duradouro, a conformidade desse uso com o direito natural e a aprovação expressa ou tácita pelo Estado[30].
Independentemente de voltarmos ao assunto mais abaixo, em termos mais desenvolvidos, diga-se, desde já, que esta não é a concepção dominante na doutrina moderna, que perfilhamos.
Os costumes jurídicos são factos normativos, constituídos por condutas ou omissões, seguidas na vida social ou de uma instituição, de modo reiterado ao longo do tempo, por serem tidas como de cumprimento obrigatório, ou por permissões lícitas (e portanto insancionável).
Ou seja, na sua formação congregam-se, pois, dois elementos:
a)- por um lado, o elemento externo: a prática prolongada, generalizada, e uniforme; e
b)- por outro, o elemento interno: a «opinio iuris vel necessitatis», ou seja, a convicção jurídica generalizada da obrigatoriedade de conformar os comportamente a esse costume.
A generalidade dessa prática existe mesmo que não tenha uma abrangência em todo o território nacional, mas apenas que no âmbito em que esse uso exista ele se revele no comportamento da generalidade das pessoas aí residentes ou das que integram uma dada instituição, classe ou actividade.
A uniformidade implica que os actos sejam semelhantes, e não necessariamente idênticos.
A sua duração no tempo tem que ficar demonstrada, mas não se exigem períodos de tempo determinados à partida, sendo suficiente a sua repetição constante durante um certo tempo necessário para se concluir que passou a ser cumprido como sendo obrigatório.
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Em direito público, designadamente internacional, constitucional ou administrativo, acontece a formação de uma norma consuetudinária quando se constate que uma norma, legal ou do costume, com solução contrária, já não é aplicável e exigível.
Quanto ao costume e aos usos sociais, como dizem MARCELO REBELO DE SOUSA E SOFIA GALVÃO, ao lado do direito estadual, gerado a partir do poder político do Estado, direito escrito, «existe um Direito estadual não escrito, costumeiro ou consuetudinário, que é «fruto das pulsões diárias do grupo e da sociedade, sem necessidade da intervenção do poder político do Estado», ou seja, que resultam da própria dinâmica da sociedade civil», que «Brotam de um jogo de vida entre forças que procuram soluções para um projecto de construção colectiva em permanente revisão», afirmando-se como tal apenas logo que reunidos os dois requisitos que são o usus e a opinio iuris vel necessitas, não dependendo nem de um reconhecimento da lei nem de uma efectiva aplicação coactiva, sendo uma forma autónoma de criação do Direito [31].
No direito administrativo, DIOGO FREITAS DO AMARAL refere a existência de numerosos casos, quer de uns, quer de outros, designadamente de costumes vigentes a todos os níveis[32], v.g., o poder regulamentar para a boa execução das leis detido pelos órgãos dirigentes da Administração directa e institutos públicos estaduais, na medida em que não estejam previstos em norma positiva, tal como, em geral, o reconhecimento pelo ordenamento jurídico do poder regulamentar de auto-organização, em termos de estrutura e funcionamento, dos órgãos administrativos colegiais (elaboração e aprovação dos seus regimentos); amplos poderes de delegação dos superiores nos seus subalternos; costumes regionais sobre feriados e locais sobre feiras; e mesmo costumes universitários sobre os intervalos académicos, «voto de Minerva» (que, assente em mito tradicional sobre a vontade da Deusa da Sabedoria, leva a que, «no caso de dúvida ou empate num júri académico, a votação ser desempatada a favor do aluno»), a tradição que leva a dever suspender-se as aulas e exames durante o período de duração da «Queimas das Fitas».
O costume não seria fonte imediata de direito, segundo as disposições iniciais do CCV sobre a matéria, mas o próprio Código Civil viria posteriormente também a reconhecer que o costume pode ser aplicado pelos tribunais do Estado e, portanto, pode ser um fonte de direito (com primazia sobre a lei: n.º1 do artigo 348.º do Código Civil[33]), embora, como já dizia J. BAPTISTA MACHADO (-Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador. Coimbra: Almedina, 1983, p.158), tal não tenha carácter decisivo, pois a sua força não só não advém da lei como esta também, por isso mesmo, não tem, só por si, força social própria para proibir o costume, dado que se este onde existir tem primazia face à lei, então esta não pode ditar genericamente a sua sorte, o que significa que, onde o costume se impuser, ele será fonte autónoma de direito, de aplicação preferente à lei, sem prejuízo da possibilidade de revogação recíproca casuística.
A questão que importa dirimir é a de saber se o costume é uma fonte primária do direito, nos termos da definição perfunctória, dada acima, ou não?
Ora, as duas principais teses sobre o assunto são a teoria estatista e a teoria sociológica.
Segundo a primeira teoria, clássica entre nós, o costume já não é, em Portugal, como foi no passado, uma fonte primária do direito, pois a única fonte primária é a lei, aparecendo o costume com vigência apenas nas situações e na estrita medida em que ele for mandado aplicar pela lei[34].
Para a segunda teoria[35], não positivista, realista, o costume continua hoje a ser, embora nos países do continente e designadamente em Portugal, com muito menor importância e densidade normativa, uma fonte primária do direito, o que aliás se constata em situações muitos claras, mesmo contra legem, que a doutrina vai apontando (como referimos anteriormente e a que poderíamos acrescentar outros exemplos colhidos na doutrina, v.g., número de litros da pipa de vinho por regiões, touros de morte nas touradas de Barrancos, etc.)
Portanto, neste debate, há que considerar inaceitável a irrealista teoria estatista e positivista, segundo a qual o costume é obrigatório se e apenas na medida em que é consentido pela vontade do Estado, ou seja, pela lei, dependendo desta no seu valor jurídico, e adoptar a doutrina romana do tacitus consensus populi (longa consuetudine comprobavit), na expressão de ULPIANO, sintonizada com a teoria sociológica, para a qual o costume é obrigatório porque e sempre que seja querido pela vontade popular ao criá-lo, mesmo que opondo-se a regras anteriormente escritas e, portanto, de facto, socialmente rejeitadas.
Ele identifica-se por se traduzir num comportamento habitual na vida social, mesmo que apenas seguido por uma parte das pessoas que a integram, devido à convicção de que se está perante uma prática de regras permissivas ou impositivas do ordenamento jurídico, neste caso passíveis de a sua violação permitir a aplicação de sanções pelas às instâncias de controlo social.
Em conclusão, constituem costumes quaisquer condutas ou omissões reiteradas ao longo do tempo, habitualmente respeitadas por serem tidas como de cumprimento obrigatório ou com permissão lícita, e, portanto, não sancionável, na vida social ou de uma instituição.
Na medida em que tais práticas sejam aceite como fonte de direito, são criadoras de chamado direito costumeiro ou direito consuetudinário
Dito isto, é fácil destacar os elementos essenciais do costume, que são o corpus e o animus:
a)-O corpus, que é a prática generalizada, ou seja, habitualmente seguida pelos membros da respectiva comunidade. A habitualidade implica uma dada reiteração ao longo do tempo e uma dada generalização dos comportamentos em cada momento durante esse tempo, sem prejuízo de condutas divergentes, que podem traduzir meros incumprimentos da regra.
Hoje, devido ao ritmo acelerado da vida social, quer no decurso do tempo, quer em cada momento, que permite constatar rapidamente a repetição e generalização maior ou menor com as práticas sociais se processam, já não se exigirá um período tão longo de tempo, como o fazia o DIP ou, no direito interno, a Lei pombalina da Boa Razão (100 anos), para que um costume deva ser aceite como fonte de direito, nem mesmo uma «prática imemorial» (ou seja, uma prática que ninguém sabe quando começou por se perder na memória dos tempos).
No domínio do direito público, basta que se entenda que uma norma positiva contrária já não é aplicável, exigível, para desde logo, sem mais indagações, devermos considerar estarmos perante um costume
b)-O animus (opinio juris vel necessitatis), que é a convicção da obrigatoriedade (regras impositivas) ou da licitude (regras permissivas).
Posto isto, vejamos as diferentes espécies de costumes, para podermos, desde já, manejar os diferentes conceitos.
Quanto ao âmbito territorial de abrangência, ele pode ser internacional, se gerado na sociedade internacional; comunitário, se gerado no âmbito das Instituições da União Europeia; regional, se gerado a nível de uma região político-administrativa ou meramente administrativa[36]; e local, se meramente ao nível da autarquia de base de uma povoação[37].
Quanto às suas posição em face das normas escritas, temos os costumes secundum legem (desenvolvendo o seu conteúdo aplicativo, muitas vezes em termos regulamentadores), praeter legem (complementando a norma escrita, em termos inovadores, em termos que normalmente caberiam a outra norma escrita) e contra legem (efectivando uma normação diferente da que está consignada na norma escrita (caída em desuso -eficácia social-, com consequente perda de eficácia jurídica), apontando assim soluções em sentido diferente).
De qualquer modo, como diz DIOGO FREITAS DO AMARAL, que defende uma teoria pluralista das fontes de direito, em face do CCV português, «o tribunal só está autorizado a julgar o caso por aplicação da lei, se não existir (ou não puder determinar-se o respectivo conteúdo) uma norma consuetudinária mais adequada que deva ser aplicada», pelo que numa «interpretação actualista» deste artigo o costume e a lei são –no entendimento da própria lei- duas fontes do Direito primário, colocadas em pé de igualdade», de tal modo que o tribunal «se puder conhecer bem o conteúdo da ambas as normas» deve aplicar ao caso sub judice«aquela das duas normas que se mostrar mais adequada à resolução correcta desse caso», ou seja, «aquela das duas normas potencialmente aplicáveis que se mostrar mais adequada à resolução do caso» [38]-[39].
E, em relação à questão mais delicada do costume contra legem ou contra constitucionem, devem ter-se como aplicáveis estes critérios de preferência normativa em relação à lei (ou a costume anteriormente afirmado):
- aplica-se o costume contra legem, que faz cair em desuso a norma legal, operando a sua caducidade, tal como o costume contra constitucionem faz cair a norma constitucional escrita (ou costumeira anterior);
- aplica-se a norma para que este costume remeter;
- em caso de normas legais ou costumeiras internas contrárias a uma norma supranacional (internacional ou comunitária), aplica-se esta fonte, sendo aquelas ilegítimas, por não poderem afectar o princípio da supremacia normativa desta e, portanto, a legitimidade aplicativa da norma do DIP e DUE;
-se se tratar de uma norma geral e outra especial, aplica-se esta;
-se se tratar de uma geral ou especial e outra norma excepcional aplica-se a norma excepcional, desde que seja legítima;
E se ambas regularem a situação de maneira semelhante, ou se houver «identidade de situações, tipos e circunstâncias»? Segundo DIOGO FREITAS DO AMARAL, no primeiro caso, prevalece a que «melhor se ajustar às circunstâncias específicas de caso concreto», e, no segundo, a que «proporcionar uma solução mais justa do caso concreto em apreciação», em homenagem ao valor justiça.
Mas uma coisa é o costume e outra são as praxes administrativas e os usos sociais. Começo por referir o conteúdo do n.º 1 do artigo 3º do CCV sobre o valor jurídico dos usos, que afirma que «Os usos que não forem contrários aos princípios da boa fé são juridicamente atendíveis quando a lei o determine. Estes usos seriam meros costumes de facto, simples práticas sociais (tidas como destituídas de animus cogentis), que não só são diferentes do costume como fonte de direito consuetudinário[40], como não seriam fonte senão quando a lei para eles remetesse. Aqui, a não afronta aos princípios da boa fé traduz uma exigência, a apreciar em cada caso, relacionada o estado ético-moral do momento[41].
Quanto às praxes administrativas, que traduzem condutas usuais que, em termos idênticos, os órgãos da Administração costumam ter habitualmente para solucionar alguns problemas de gestão corrente.
Temos aqui, v.g., no âmbito da vida universitária, a não se considerar como costume, a prática em geral sedimentada no tempo de se fazer «intervalos académicos» de 10 minutos entre as aulas e mesmo de um período adicional de tolerância de duração semelhante para o início das prelecções (não só para permitir a troca de salas e docentes, mas também para satisfação de necessidades fisiológicas e descanso regenerador dos alunos e docentes, com vista à aula seguinte), a que se poderia acrescentar-se, v.g., uma prática académica sobre a leccionação de aulas, que se pode enunciar assim: prima non datur, ultima non reciptitur, ou ainda a prática de menor exigência sobre conhecimentos para a aprovação na última cadeira de licenciatura etc..
O carácter usual de uma prática constante e idêntica, constituindo o seu corpus identificativo, aponta para um elemento semelhante ao do direito consuetudinário, tendo como especificidade o âmbito restrito dessas posturas comportamentais, apenas referentes à vida da Administrações públicas e não à vida social em geral, pelo que se impõe perguntar se não estaremos perante o costume administrativo, ou melhor, um costume criador de direito administrativo, ou, antes, face a meros usos académicos.
A alínea d) do n.º 1 do artigo 124.º (Dever de fundamentação), diz que, «devem ser fundamentados os actos administrativos que, total ou parcialmente, decidam de modo diferente da prática habitualmente seguida na resolução de casos semelhantes, ou na interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou preceitos legais».
E, assim, podemos concluir que de duas uma: se tal prática não for contra legem, situação em que o preceito não é aplicável a menos que deva sê-lo obrigatoriamente por ser costume, temos práticas interpretativas ou integrativas de lacunas, e portanto, meramente secundum legem ou praeter legem, em que importa procurar distinguir a sua natureza jurídica segundo a sua intensidade normativa mas não segundo a sua natureza jurídica e não jurídica, pois não é possível defender-se a tese de que tais práticas são indiferentes ao direito, ou seja, não vinculam minimamente a Administração Pública.
Ou seja, caso não se comprove que existe o animus suficiente para se considerar que estamos em face de costume e portanto de uma regra de cumprimento obrigatório sem mais, então estaremos perante uma mera «praxe» administrativa, mas que, por força da lei procedimental geral, de qualquer maneira continua a ser obrigatória e, portanto, também, fonte de direito, se não houver razão aceitável para a alterar, mudando de critério justificadamente.
A menos que, o que nada impede, entretanto, mesmo sem justificação, comece a ser desrespeitada por uma prática diferente, criada e reiterada com animus próprio do costume, ou apareça norma escrita distinta, a sai não aplicação sem qualquer razão válida é ilegal, não só por força directa da norma citada, mas de verdade em geral também por força do princípio constitucional da igualdade de tratamento, pelo que temos que convir que em princípio a praxe é vinculativa e, portanto, fonte de direito e como tal só passível de revogação por outra fonte de direito ou por outra orientação devidamente justificada, que, por sua vez, se poderá vir a afirmar também, se ganhar estabilidade aplicativa, e como tal merecer integrar o ordenamento jurídico, como fonte de direito.
No que se refere à norma jurídica positiva («lei em sentido amplo»), importa esclarecer o seguinte:
A norma interna escrita, lei ou regulamento, é fonte primária do direito[42].
Qualquer comando de carácter geral e abstracto, regra ou princípio, na medida em que obriga a um comportamento social é fonte de direito e, portanto, uma norma jurídica, embora só se considere como leis aqueles que simultaneamente tenham origem numa instituição do poder legislativo e formalmente se designem de lei ou decreto-lei, dado quer os titulares deste poder também podem produzir actos de outra natureza, cuja distinção material é em geral questionável (v.g., resoluções ou normas regimentais, a AR, e regulamentos, o governo).
Mas, além destes actos normativos, quando em Direito Administrativo nos referimos ao princípio da legalidade, devemos considerar incluídas quaisquer outras normas, não apenas convencionais, de natureza legal ou regulamentar, de fontes supranacionais, internacionais ou unionistas (da CE ou da EU em geral) e nacionais (também a Constituição da República Portuguesa), regionais (leis e regulamentos) como as regulamentares locais.
[1] Usando aqui a expressão «aberto» com um sentido já anteriormente utilizado em outra obra (Direito do Ambiente. Coimbra: Almedina, 2001), e que, à falta de melhor terminologia, também LUCIANO PAREJO ALFONSO, em seu recente Manual, acabou por acolher.
[2] Domínio em que seguimos os tópicos da exposição relativamente sintética «Nomologia comunitária», inserida na nossa publicação Direito do Ambiente, edição da Almedina, 2001, p.283 e ss.
[3] E as decisões, se, ao na linha da teoria do DUE, incluirmos também os actos administrativos como fonte de direito.Vide, v.g., CONDESSO, F. – «A nomologia comunitária». In Direito do Ambiente. Coimbra: Almedina, 2001, p.283 e ss.
[4] Artigo 24.º, n.º2, al.c) do EERC: «Aprovar regulamentos, directivas e decisões, bem como as demais deliberações que lhe são atribuídas pela lei e pelos presentes Estatutos». N.º 6 do artigo 65.º: «Os regulamentos, as directivas, as recomendações e as decisões da Entidade Reguladora da Comunicação (…)».
[5] AMARAL, Diogo Freitas do –Manual de Introdução ao Direiuto. Colaboração Ravi Afonso Pereira. Coimbra: Almedina, 2004, p.371.
[6] AMARAL, D.F. –o.c., p.359.
[7] Quer em termos de fontes, quer de competências para legislar (Assembleia da República, Governo, Assembleias Legislativas Regionais) ou regulamentar, quer sobre a forma e publicação das leis e a sua vigência ou a teoria jurídico-política da lei, processos legislativos, etc., matérias que, a não serem dadas em PGD, melhor caberão na cadeira de Direito Político ou de Direito Constitucional.
[8] AMARAL, D.F.-Manual de Introdução ao Direito.Coimbra: Almedina, 2004, I Vol., p.343 e ss. Índice temático do capítulo sobre o sistema da hierarquia das fontes: O problema da hierarquia das fontes, O problema em face da teoria clássica, A teoria neo-clássica: um constitucionalismo nacionalista, A Posição de DIOGO FREITAS DO AMARAL: As fontes internacionais, As fontes comunitárias europeias, A guerra e a revolução, A Constituição, O Direito ordinário, ou infra-constitucional.
[9] Artigo 1º do CCV (Fontes imediatas): «1São fontes imediatas do direito as leis e as normas corporativas. 2. Consideram-se leis todas as disposições genéricas provindas dos órgãos estaduais competentes; são normas corporativas as regras ditadas pelos organismos representativos das diferentes categorias morais, culturais, económicas ou profissionais, no domínio das suas atribuições, bem como os respectivos estatutos e regulamentos internos. 3. As normas corporativas não podem contrariar as disposições legais de carácter imperativo»; Artigo 2º (Assentos): «Nos casos declarados na lei, podem os tribunais fixar, por meio de assentos, doutrina com força obrigatória geral» (Revogado pelo Decreto-Lei 329-A/95, de 12-12); Artigo 3º (Valor jurídico dos usos):«1. Os usos que não forem contrários aos princípios da boa fé são juridicamente atendíveis quando a lei o determine. 2. As normas corporativas prevalecem sobre os usos; Artigo 4º (Valor da equidade): Os tribunais só podem resolver segundo a equidade): Quando haja disposição legal que o permita; b) Quando haja acordo das partes e a relação jurídica não seja indisponível; c) Quando as partes tenham previamente convencionado o recurso à equidade, nos termos aplicáveis à cláusula compromissória» (Código Civil, Livro I, Parte Geral, Título I, Das leis, sua interpretação e aplicação, Capítulo I, Fontes do direito).
[10] MARQUES, José Dias –Introdução ao Estudo do Direito .3.ªEd., Lisboa: José Dias Marques, 1970, p.197 e ss.
[11] Os diplomas concretos em que aparecem escritas na medida em que são apenas o continente das normas, são designados como fontes em sentido textual, para se distinguir do seu sentido jurídico-formal, ou seja, dos factos normativos.
[12] Próximo desta catalogação, no plano jurídico, veja-se De Castro, enunciando como principais, os três tipos de fontes que considera utilizados na ciência jurídica, que denomina fonte filosófica (raíz do jurídico), fonte técnica (fontes de direito positivo, com a sua variada tipologia de normas constituindo o ordenamento jurídico positivo, determinadas legitimamente por organizações jurídicas, v.g., lei, costume) e fonte instrumental («fontes de conhecimento do direito positivo ou o material que se utiliza para averiguar o conteúdo das normas jurídicas»):DE CASTRO, F. – Naturaleza de las reglas para la interpretación. Madrid, 1978, p.139-140.. há quem fale no direito como faculdades (como direitos subjectivos), como norma (como fonte xe direito objectivo) ou como conhecimento ou ciência (como fonte do conhecimento do direito ): CASTAN TOBEÑAS, J –Derecho Civil Español Común y Foral. Ed.rev.ista por José Luis de los Mozos. Madrid, 1975.
[13] Traduzindo à letra: fontes do ser do direito.
[14] Traduzindo à letra: fontes «de conhecimento do direito».
[15] O cidadão não tem de conhecer a norma que é aplicável em cada momento e interpretá-la correctamente (ignorantia legis non excusat: vide artigo 6.º do CCV)?
[16] E na medida em que, quem desobedecer às autoridades, comete o crime do artigo 348.º do Código Penal (desobediência à autoridade pública), sujeitando-se o cidadão, por princípio, a estar sujeito a processos crimes se quiser cumprir, contra a posição errada da autoridade, a norma aplicável, sob pena de se sujeitar a julgamento e provar em tribunal a ilegalidade da ordem por invocação de norma indevida, para obter a justa absolvição? Se os tribunais não podem aplicar normas injustas ou imorais, por força da própria cRP, como pode admitir-se tal postura injusta e até imoral, por princípio, no agir da Administração Pública?
[17] Em geral, comungamos das posições e argumentos de DIOGO FREITAS DO AMARAL, que explanaremos, posições que sempre foram em geral as nossas, constantes de textos (e lições policopiadas desde 1992), sofrendo a influência da universidade de Bruxelas, onde, na década de oitenta, estudamos, sem prejuízo de mantermos definições, expressões, argumentos e até algumas posições distintas, na linha do que sempre ensinamos.
[18] Vide, v.g., JORGE MIRANDA –Direito Constitucional. 3.ª Ed, Vol III.Não nos referiremos desenvolvidamente às posições com que PAULO OTERO, em recente livro denominado Legalidade e Administração Pública, enfileira na defesa de uma doutrina que obriga ou dispensa a Administração Pública de pocurar aplicar a norma que resulta aplicável, para os cidadãos e os tribunais, segundo os critérios científicos da hierarquia das normas, após um esforço de longa investigação neste caminho (tal como não é aqui o ligar para desmontar todas a argumentação em que assentam estas doutrinas criadores a de uma dualidade de direitos aplicáveis num só ordenamento jurídico). Mas, repescando algumas passagens mais significativas deste autor, no que se refere à aplicação das normas pela Administração Pública, não deixamos de referir que o autor opta por preferir «sacrificar momentaneamente a discussão sobre a validade do fundamento normativo da actuação administrativa e, nesse sentido, a própria validade da respectiva decisão» por considerar de «preferir a segurança (…) fundada numa norma inválida, à legalidade ou inconstitucionalidade», assim acabando por chegar a um «opção subjacente à excepcionalidade da vinculação administrativa ao critário hierárquico», a uma «preferência pela invalidade do fundamento normativo da actuação dos órgãos administrativos» (sic), concluindo, entre várias coisas, face às posições que vai tomando, que «vinculada normalmente a ter de aplicar uma normatividade inconstitucional ou ilegal, enquanto expressão da ausência de um poder administrativo genérico de rejeição aplicativa de normas inválidas, a Administração Pública pode encontrar-se obrigada a praticar actos ilegais». E, por isso, o autor não tem outro remédio senão, em coerência, reconhecer a aberração a que as suas argumentações dão origem, concluindo, pelos vistos tranquilamente, dado que não reviu: «revelando-se aqui a incoerência da configuração global do princípio da juridicidade e a quebra da ideia de sistema jurídico-administrativo: em tais casos, o sentido vinculativo dos órgãos administrativos à juridicidade é contraditório, imperfeito e incompleto» (ponto c) da conclusão geral, ou ponto 21.7, sétima conclusão, da Parte II). O autor, prisioneiro das suas posições ultraconservadoras sobre a relação da Administração Pública com o direito, não pode deixar de concluir pelo absurdo da normalidade da «auto-vinculação da Administração Pública à invalidade» e, portanto, pela normalidade de um obrigatório e sistemático recurso aos tribunais pelos cidadãos e outras administrações em relação interadministrativa, transformando a jurisdicção em verdadeira administrada quotidiana da legalidade administrativa, e nem intenta voltar ao início para se obrigar a rever todas as bases dogmáticas ínsitas nas suas posições anteriores, de modo a ter de concluir da única maneira possível em Estado de Direito, para o qual a sua reflexão devia contribuir, aceitavelmente: que o sentido vinculativo dos órgãos administrativos à juridicidade, tal como deve ser cientificamente configurado pelo sistema jurídico, não é (pelo menos no campo dos princípios, do dever-ser, independentemente das práticas ou doutrinas erradas), nem contraditório, nem imperfeito e nem incompleto. Até porque se a conclusão, com as suas teses, o que é, e não devendo, não podendo ser, então haveria que dizer o que deve ser feito para não o ser, o que levaria, na mesma, o autor a dizer à frente o que evitaria se voltasse atrás e tivesse refeito todas as suas posições teóricas anteriores que o obrigaram a cair nesse inaceitável abismo teórico da ilegalidade que teve de considerar «insuperável». Basta ler a doutrina defendida por DIOGO FREITAS DO AMARAL ou por nós mesmos sobre a hierarquia das normas para se perceber como as conclusões sobre o tema se situam ou podem situar em termos bem diferentes.
[19] E mais do que isso, inclui mesmo a obrigação de aplicar as Decisões da União Europeia, que em geral são meros actos administrativos, mesmo que contrárias a normas nacionais.
[20] No direito comunitário abrange não só actos gerais e abstractos, mas até os actos concretos e individuais. No Tratado da Comunidade Europeia, temos como actos típicos «criadores de direito», os regulamentos, directivas, decisões e, por vezes mesmo, tudo dependendo do seu conteúdo real, independentemente da designação atípica, os pareceres e recomendações.
[21] Princípios e regras jurídicas constituem as normas jurídicas. Sobre estes conceitos, vide, v.g., Souda, Marcelo Rebelo de; Galvão, Sofia –Introdução ao Estudo do Direito. 4.ª Ed., Lisboa: Europa-América, 1998, p.188 e ss.
[22] Vide, AMARAL, Diogo Freitas do –oc, p.483 a 562: como actos produtores de direito, as praxes administrativas e usos sociais, convenções colectivas de trabalho, normas corporativas e profissionais, adopçãp de normas técnica, declarações políticas orais.
[23] Tal como nós sempre havíamos feito no ensino em geral e, também, já no debate em Comissão de Revisão Constitucional, no processo não acabado de finais da primeira metade da década de noventa e, simultaneamente, em textos académicos, designadamente no capítulo sobre fundamentos comunitários da política e do direito do ambiente: CONDESSO, F. –Direito do Ambiente. Coimbra:Almedina, 2001, p.282 e ss.
[24] AMARAL, D.F. –oc,P.570.
[25] A. e o.c., p.575 e 576.
[26] CRISAFULLI, Vezio –«Per la determinazione del concetto dei principi generali del diritto». In Studi sui principi generali dell’ordinamento guiridico. Pisa, 1941.
[27] Constante da Lei n.º 46/2007, 24 de Agosto de 2007, que regula o acesso aos documentos administrativos e a sua reutilização, revoga a Lei n.º 65/93, de 26 de Agosto, com a redacção introduzida pelas Lei n.os 8/95, de 29 de Março, e 94/99, de 16 de Julho, e transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 2003/98/CE, do Parlamento e do Conselho, de 17 de Novembro, relativa à reutilização de informações do sector público (D.R. n.º 163 Série I)
[28] V.g., MENDES, João de Castro –Introdução ao Estudo do Direito. Lisboa.PF, 1994, p.77.
[29] E normas, segundo a seguinte ordenação de valor hierárquico: normas internacionais, normas comunitárias e da União Europeia em geral, normas constitucionais nacionais, leis de valor reforçado, leis simples, regulamentos (de acordo com a diferente ordenação se supremacia dos órgãos emissores), etc.. Neste âmbito, há que referir o fenómeno do declínio e relativização da lei em sentido estrito como fonte do direito.
[30] MARTÍNEZ ROLDÁN, L; FERNÁNDEZ SUÁREZ, J.A.-Curso de teoría del Derecho y metodología jurídica. Barcelona: Ariel derecho, 1994 , p.167.
[31] SOUSA, Marcelo Rebelo de; GALVÃO, Sofia –Introdução ao Estudo do Direito. 4.ª Ed., Lisboa: Europa-América, 1998, 130 e ss.
[32] Manual de Introdução ao Direito. Coimbra: Almedina, 2004, p.379.
[33] Artigo 348.º (Direito consuetudinário, local, ou estrangeiro): «1. Àquele que invocar direito consuetudinário, local ou estrangeiro, compete fazer a prova da sua existência e conteúdo; mas o tribunal deve procurar, oficiosamente, obter o respectivo conhecimento.2. O conhecimento oficioso incumbe também ao tribunal, sempre que este tenha de decidir com base no direito consuetudinário, local ou estrangeiro, e nenhuma das partes o tenha invocado, ou a parte contrária tenha reconhecido a sua existência e conteúdo ou não haja deduzido oposição.3. Na impossibilidade de determinar o conteúdo do direito aplicável, o tribunal recorrerá às regras do direito comum português». Trata-se, aliás, de uma norma que vem no seguimento da solução já constante do artigo 521.º do CPC de 1939. Vide REIS, José Alberto dos –Código de Processo civil Anotado, Vol.III, 3.ª Ed., Coimbra: Coimbra Editora, 1950, p.304 e ss, e AMARAL, D.F. do –o.c., p.382, nota 17.
[34] Como acontece, v. g., nos artigos 1400.º e 1401.º do Código Civil; tese assente no dogma positivista mas que, mesmo assim, vai ao ponto de esquecer o próprio mandato geral dado aos tribunais e em geral aos aplicadores do direito, constante do n.º1 do artigo 348.º também do Código Civil.
[35] Na linha da doutrina anglo-saxónica, que sempre valorizou o costume e a jurisprudência como fontes de direito.
[36] Seria o caso de costume formado nas regiões Autónomas dos Açores ou/e Madeira, ou de qualquer maneira em áreas geográfica infraterritoriais alargadas, v.g., para lá do Marão (onde «mandam os que para lá estão»), no Algarve, no Minho, etc.
[37] Exemplo de um costume meramente local é o da morte pública dos touros em praça, na povoação de Barrancos.
[38] Oc, p.384.Tese de igualdade e disponibilidade judicial de escolha de norma aplicável, que, a nosso ver, foi concebida por um legislador que não pretendia atribuir ao costume natureza de fonte primária, mas se viu confrontado com a necessidade de enquadrar a aplicação por tribunais nacionais de direito estrangeiro, sendo certo que, nalguns sistemas, o costume é direito aplicável, pelo que a jurisdição nacional, de qualquer modo, teria de o aplicar em situações definidas pelo direito internacional privado. Trata-se, pois, de um artigo que pretendeu em geral responder a essa necessidade, como se vê quando fala na parte final do n.º3 em direito comum «português», mas a que o legislador acabou por referir o direito consuetudinário, mas meramente o local, em que, nas condições aí referidas, admitiria a preterição da lei, aliás parecendo mesmo pretender acentuar, em princípio, a preferência pela aplicação do costume.
[40] PINTO, Carlos Mota –Teoria Geral. 2.ª Ed.,Coimbra, p.49.
[41] Vide, v.g., LIMA, Pires de; VARELA, Antunes –Código Civil Anotado, 1.º, 11.
[42] Os tipos de actos legislativos encontram-se previstos no artigo 112.º, n.º 1, da Constituição, sendo as leis, os decretos-leis e os decretos legislativos regionais.