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COMENTÁRIO PREFACIAMENTO-LIVRO EURO-PHILIPP BAGUS

COMENTÁRIO PREFACIAMENTO-LIVRO EURO-PHILIPP BAGUS

Comentário ao Prefácio do Prof. João Ferreira do Amaral à tradução portuguesa do livro de Colega da, também minha, URJC, Prof. Philipp Bagus, intitulado "The Tragedy of the Euro"

FERNANDO CONDESSO

Sendo jurista, faço-o pelo interesse que a Economia Política e a actualidade económica (juntamente com a filosofia, em que também me licenciei) sempre me despertou desde o bancos da Universidade e, por isso, até porque, sendo também professor em Doutoramento de Políticas Públicas de Desenvolvimento Económico-Social, não deixo de ir acompanhando a evolução do pensamento e das políticas económicas.
Uma primeira nota, prévia, é de manifestação de admiração, criada e mantida ao longo dos tempos, pela maior clarividência e coerência que sempre encontrei, no contexto nacional, no Prof. João Ferreira do Amaral quanto à temática referente ao Euro (por parte de alguém, que, como eu, independentemente das reticências sobre o modo como se avançou para o euro e sobretudo Portugal, foi seu defensor ao nível dos Estados da UE preparados para o efeito; alguém, que sempre se bateu pela crescente integração, não só económica, mas também política da Europa; ou seja, um federalista, mesmo que não necessariamente segundo o modelo americano -fui mesmo, durante algum tempo, Presidente do Grupo Federalista dos parlamentares da Europa, qualidade em que intervim em Roma nas Comemorações dos 30 anos do Tratado da Comunidade Europeia). Entrando no comentário: confesso que só li o Prefácio neoliberal de Huerta de Soto (que contém diagnóstico e parte final interessantes, mas pelo meio contém afirmações na lógica de um neoliberalismo que não reconhece que falhou e acusa -não as políticas intervencionistas concretas- mas indevidamente o próprio conceito de estímulo público), a Introdução e o Cap.1 do Livro do nosso Colega docente Bagus, mas, só pelo que li -veremos o que mais nos espera, ao longo do texto- não deixo de estranhar que o Prof. JFA tenha aceite prefaciar uma obra tão assumidamente ultraliberal (na linha dos sucessores da Escola Austríaca, F. Hayek e outros, reaccionários às preocupações de justiça social, com a clara defesa da irresponsabilidade da lógica das teses dos mercados perfeitos, auto-corrigíveis, desde que plenamente livres de qualquer interferência pública e portanto com a expressa responsabilização, na crise e no seu prolongamento, da intervenção do Estado e seus estímulos (e preocupações destes ligadas muito com a lógica da procura; coisa diferente seria criticar justamente os objectivos ou os atrasos ou o excesso nuns casos e a insuficiência noutros das medidas desses estímulos) e, ainda por cima, com um texto recheado de distorções, quer no plano da afirmação das ideias liberais, quer no plano histórico da visai subjacente à criação da Comunidade Europeia e do pensamento dos seus líderes criadores que eram democratas-cristãos (mas não, como afirma erradamente, liberais clássicos, antes intervencionistas-keynesianos -o que pese ao autor, não significa socialista, pois nunca Lord Keynes deixou de estar ligado ao partido liberal inglês e de defender o capitalismo como o melhor sistema para produzir o bem-estar dos povos) e eram federalistas (os três por ele citados promoveram inicialmente um projecto de Constituição de Federação Europeia: política, económica e militar, que caiu precisamente na Assembleia Nacional Francesa, pelo que não tem sentido dizer que o federalismo interessa ao projecto europeu francês e não ao alemão), quer da actual ideologia enformante, seja sobre a criação do euro, seja em geral do própria UE, seja da confusão geral inaceitável que ele faz entre socialismo e defesa do consenso keynesiano ou da ideologia do Estado Social; da identificação entre liberdade e anti-federalismo, junção entre liberalismo clássico e anti-federalismo, por um lado, e pensamento católico, por outro, desconhecendo realmente o pensamento da igreja católica quer sobre a justiça social que o liberalismo austríaco, mesmo nas versões vintistas, tanto despreza, quer sobre a unificação europeia. Por que é que um estado federal europeu tem de ser "prejudicial para a liberdade do indivíduo" (p.31)? E por quê sempre, nos neoliberais, a preocupação e só com o indivíduo? E o bem da sociedade no seu todo, feita de e pelos indivíduos? E por que é que o Tribunal de Justiça Europeu (e também, como está nos Tratados e bem, os nacionais) não deveriam imiscuir-se em geral nos conflitos relacionados com os incumprimentos do direito europeu, e só "supervisionar" conflitos entre os Estados e garantir as liberdades fundamentais" (e só as 4, do liberalismo económico, claro?). Como poderão os Estados economicamente débeis poder defender-se com a aplicação pura e simples da teoria do liberalismo internacionalista, nos termos rígidos defendida na página 32? Não será que os Estados à partida mais fortes economicamente estão a explorar, esvaziar, pela via das liberdade económicas e das balanças comerciais, os mais frágeis, sem compensações e transferências financeiras integracionistas, e sem preocupações em canalizar os seus excedentes para investimentos e aumento da procura agregada, como caberia a um espaço pretensamente integrado? Vemos um Bagus que expressamente afirma e abjura, sobre a UE, o facto de que "Querem um Estado Social europeu que assegure a redistribuição, a regulação e harmonização da legislação na Europa . (...)" (p.33). E porque não? porque há-de ser só a liberdade dos Estados fortes fazer circular livremente os capitais, bens, serviços, para explorar os fracos e acabarem com o Estado Social destes? E porque errou o BCE, ao fazer o que, infelizmente, já fez tarde e mal, porque os estatutos à alemã, só preocupados com a inflação, não permitem atacar situasses de crise? Ataca a federação europeia porque será burocrática. Não será que de natureza burocrática e ademocrática a independência do actual Banco Central Europeu, sem legitimação política, e aliás com soluções de controlo finalistas da sua acção pré-estabelecida em Estatutos pensados para a Alemanha e para as situações de equilíbrio? Quanto à moeda única, poderei vir a concordar com muito do que escreveu e irei ler, pelo que me pareceu do Prefácio do Prof. JFA, mas o autor, ao colar tal objectivo a certos interesses franceses ou socialistas, esqueceu-se que o conservador Chanceler Köhl foi o seu grande defensor, a ponto de aceitar perder as últimas eleições a que ia concorrer, pois, como grande estadista que foi, sacrificou-se em nome daquilo que acreditava ser o interesse, não da França ou de socialistas, mas da Europa. Quanto à crítica de a língua alemã não ser língua da UE e só o inglês, que não contesta, e o francês, que lhe causa engulhos, não entendo, pois eu fui deputado europeu e (como sempre fui desconfiado das traduções), lia os textos oficiais e até de trabalho, pela versão em português e, quando algo me parecia estranho, conferia por outros originais, designadamente pelo alemão. Ele existia. Acabou? (Eu critico, sim, mas é a ONU ou a Associação ACP-EU e outros organismos internacionais, não porque uma língua meramente europeia, como o alemão, mas o português, que tem maior a expressão mundial ou Regional, a nível geográfico e populacional, não ser língua oficial). As considerações efectivadas sobre as consequências da existência do euro, praticamente responsável por tudo o que de mau há na UE e Estados, são racionalmente aceitáveis? E a tese de que o fim do euro nada teria importância para a Europa (pois que nada tem ver com a subsistência normal da EU), está provada? E a afirmação de que o fim do euro só teria que ver com o fim da versão socialista da Europa é aceitável? E a ideia final do Cap. I, de que o facto da existência de uma moeda em cada Estado é mais consentânea com o valor europeu da liberdade tem algum sentido? Se tem, então porque não defender que devemos aumentar mais a liberdade, dando, como na Idade Média, também moeda própria a cada Região ou a cada município? Para um defensor do liberalismo global, sem peias à escala mundial, qual seria o problema de haver uma moeda de reserva mundial (uma qualquer “bancor”) ou mesmo de circulação mundial, além das actuais ouro e prata, naturalmente?