Criar um Site Grátis Fantástico

PROTEÇÃO DAS AZINHEIRAS E DOS SOBREIROS

PROTEÇÃO DAS AZINHEIRAS E DOS SOBREIROS

PROTEÇÃO DO ECOSSISTEMA DOS MONTADOS MEDITERRÂNICOS. AZINHEIRAS E SOBREIROS

1.CARATERIZAÇAO GERAL DOS MONTADOS IBÉRICOS

O «monte» alentejano, em geral, numa definição ôntica, ligada à natureza das coisas, independentemente dos seus diferentes tipos, pode ser definido como sendo todo o «sistema agropecuário e florestal de criação antrópica que se desenvolve sobre solos de diferentes características, capacidades edáfilas e clima primordialmente variável em seus parâmetros, com uma vegetação de quercíneas, cuja diferente tipologia e densidade caracteriza a diversidade dos sistemas de montado em função dos seus componentes (elementos e fatores) e da sua inter-relação e ação conjunta».

Quais as chaves da paisagem do montado mediterrânico, designadamente o alentejano, neste final do século XX?

Há vários tipos de «montes». Podemos falar nos modelos de montados de pasto arborizado-bovinos, trabalho intensivo arborizado-ovinos, de matorral arborizado-caprinos, de pasto e trabalho extensivo arborizado-ovinos e trabalho extensivo arborizado-porcino.

O homem não pode fugir ao grande desafio de construir um desenvolvimento sustentável, pelo que o mundo mediterrânico e os seus espaços merecem bem as preocupações, investigações e estudos que os poderes públicos e os académicos têm realizado. Os montados alentejanos são, como todos os outros, muito antigos, enquanto sistema fisionómico-ecológico, embora com perda continuada do típico coberto arbóreo. No entanto, este ecossistema, apesar de flexível e resistente, é vulnerável, requerendo a ação permanente antrópica que modificou profundamente o seu equilíbrio ecológico, degradando o monte mediterrânico primitivo e cuja omissão interventiva faria reconduzir as coisas a uma regeneração esclerofila, criadora de uma nova paisagem.

A degradação atual deste ecossistema mediterrânico acentuou-se especialmente no pós-guerra, e em Portugal no âmbito anómico de meados da década de setenta, calculando-se que, devido às políticas de regadio e criação de barragens, nuns sítios, e aos incêndios, noutros, desde a década de cinquenta, mas sobretudo nas décadas de sessenta e setenta, tenham desaparecido no sul da península Ibérica, mais uma a duas dezenas de milhões de pés de quercíneas, a que há a acrescentar as desadaptações agressivas resultantes da imposição de raças bovinas estrangeiras, reflorestação com árvores alóctones e abandono de árvores agrícolas de rotação, além do envelhecimento e despovoamento da população e impacto negativo da peste suína africana (raia vermelha) (só na Estremadura espanhola desapareceram cerca de 8 milhões, segundo Filipe Leco Berocal, no seu livro «Delimitación y Modelización de los Espacios Adehesados Extremeños», Fundicot, Cáceres, 1996, págs. 33 e 34).

Ora «a importância dos espaços naturais na vida do homem e vice-versa, é um facto evidente», originando a conversão dos «espaços naturais em espaços geográficos», começa por dizer Filipe Leco Berrocal, na Introdução à obra citada, onde estuda os montados, tratando «asséptica e cientificamente de definir, separar e delimitar os seus componentes e possíveis modelos» (Prólogo, Eduardo Alvarado Corrales).

Num plano jurídico, o seu enquadramento foi variando nos vários países, desde os aproveitamentos coletivos consequentes ao povoamento inicial ao sistema de exploração, designadamente com o arrendamento dos pastos e frutos, e com liberdade de alienação. Estamos perante uma realidade sobre a qual o poder político continua hoje a fazer incidir a sua ação, com legislação reformista, apontando caminhos claros de intervenção administrativa incentivadora, circunscritiva e sancionatória.

O montado é uma realidade que traduz um ecossistema modificado pelo homem, como é próprio de qualquer sistema agrícola (García Ramón, 1974). Trata-se de um espaço seminatural, tendo o homem intervindo sobre elementos botânicos, de quercíneas, «aclarando suelo y vuelo”, estratos sobre que assenta este ecossistema; um ecossistema baseado na exploração extensiva de uma grande superfície» (F. Leco Berrocal, o.c., pág. 12) e que permita um triplo aproveitamento, agrícola, ganadeiro e florestal.

E é um espaço seminatural, que tem merecido, em si mesmo, um enquadramento legislativo dos poderes públicos dos diferentes países.

Na região autónoma da Estremadura, merece destaque a Lei n.º 1/1986, de 2 de Maio, sobre a «dehesa en Extremadura» (D.O.E. n.º 40, de 15.5.86), inspirada na anterior Lei estatal de 16.11.79, n.º 34/79, sobre Quintas Manifestamente Melhoráveis (B.O.E. n.º 281, de 23.11.79), e que pela sua atualidade, justificam aqui algumas considerações. A lei regional visa «fomentar o progresso económico e social» no âmbito da realização de uma reforma agrária «entendida como a transformação, modernização e desenvolvimento das estruturas agrárias, enquanto elemento essencial para uma política de desenvolvimento” e “correção de desequilíbrios territoriais dentro de Extremadura», que compatibilize a função social que toda a propriedade tem, com o pleno emprego» (parte final do n.º 1 e n.º2 da exposição de motivos).

O legislador regional pretende assentar a reforma agrária estremenha nos sistemas agrários (ponto 4) e pretende obter tal, situando soluções que revelam a preocupação central com a determinação da produtividade da «dehesa» (cap. III), o que o leva a obrigar ao seu registo administrativo, e à instauração de planos corretivos coercivos do seu aproveitamento e melhoramento (cap. IV), com a consequente classificação e sancionamento — de natureza administrativa e tributária — das situações de abandono e mudança de cultura não autorizada ou desaproveitamento em face da produção tida como potencial (cap. V e VI e artigo 32.º do cap. IX), com possibilidade da extinção do imposto de mau aproveitamento, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 29.º , imposição de técnicas culturais e sanitárias (cap. VIII e anexo 3), sem prejuízo da possibilidade de mudanças de culturas, controladas pela administração Pública regional (cap. IX) e sem prejuízo da alteração para regadio por decisão da administração estadual, complementada com um regime de apoios administrativos, não apenas às «dehesas» boiais e comunais («baldios», também existentes em Portugal, embora não no Alentejo, onde os grandes agrários, durante o século passado os foram absorvendo irreversivelmente, mas em todo o restante território onde as comunidades residentes tinham sido desapossadas por práticas e textos das últimas décadas, a favor de serviços florestais do Estados e autarquias locais, cuja lei reguladora e de devolução aos compartes resulta de um projeto de lei 1993, da minha autoria), de cujo regime trata o capítulo XI, mas também à unificação das diferentes titularidades dominiais e de aproveitamentos (cap. X e XII).

O diploma estremenho, começando por recordar o conceito tradicional de reforma agrária, em parte confundido «com a questão da terra», uma reforma que tem raízes no mundo romano e portanto dentro da esfera cultural ocidental (repartição de terras entre os camponeses), tal como aparece desde os Gracos, até Pascual Carrión, passando por Olavide, independentemente das variações formais ou dos meios de realização, diz claramente que a sua disciplina vai noutro sentido, porquanto «uma lei de Reforma Agrária, como a presente, no último terço do século XX e com a pretensão de estar vigente no XXI, não pode pretender a simples repartição de terras, como objetivo primário, mas a otimização das produções da propriedade agrária como geradores de desenvolvimento, assumindo somente a mudança de propriedade naqueles casos extremos, em que esta seja incapaz de cumprir o fim que a legitima» (ponto 3).

Qual o conceito de «dehesa», que o legislador espanhol acolheu e cuja importância resulta desde logo de lhe caber a aplicação do regime jurídico atrás referido?

A «dehesa» (montado) é toda a quinta rústica ou o conjunto de quintas que pertençam ao mesmo proprietário e formem parte de uma unidade de exploração agrária, desde que fiquem no mesmo território municipal ou em territórios contíguos, na qual mais de cem hectares da sua ou suas superfícies seja suscetível, segundo o seu destino agrário mais idóneo, de um aproveitamento ganadeiro em regime extensivo (n.os 1 e 2 do artigo 1.º da Lei).

Estas são as «dehesas» abrangidas pela legislação específica, destinatárias das preocupações, imposições, medidas e sanções do poder político regional que, em face dos objetivos visados, dá relevo desde logo à sua dimensão.

Aliás, esta definição legal difere do conceito tradicional, que aposta para uma área arborizada de exploração sustentada pelos substratos «suelo y vuelo»,e não apenas áreas de pastos, para aproveitamento ganadeiro extensivo.

As «dehesas» estremenhas registadas em Dezembro de 1988 eram em número de 4.233, ocupando 1.896.530 ha, quando a superfície arborizada de quercíneas era, segundo F. Leco B. de apenas 958.610 ha (pág. 218 da o.c.), embora reconhecendo que a superfície ocupada por quercíneas na Extremadura seja superior a 1 milhão e 200 mil ha, isto é, 1/3 da superfície regional (pág. 211).

São muitos os fatores históricos desta atual realidade fisionómico-ecológica, a que se deve o desenvolvimento da «dehesa». Segundo Filipe Leco Berrocal, a etimologia em castelhano assenta na palavra latina «defensa», que era uma porção de terra cercada, de domínio público ou particular, afeta ao uso agrícola e florestal, mas a sua origem concreta é medieval, situando-se no século XIII (García Oliva, 1986), em que aparece como um instituto jurídico-administrativo, a significar uma realidade apropriativa ou restritiva, isto é, de reserva de «um uso ou aproveitamento», remontando aos povoadores, que recebendo casas adquiriam também direitos de aproveitamento coletivo.

Eram reservas que tinham uma área de pastoreio para gado («dehesas Boyales»), e também permitiam guardar pastos para a transumância ganadeira, em que aposta o rei Afonso X, o Sábio, a partir de 1273, com o foro de criação do «Honrado Concelho da Mesta», permitindo uma distribuição alternativa de alimento entre zonas de inverno e de verão, o que aliás levava queimar quercíneas para aumentar os pastos.

A partir do século XVI, sobre elas incidem contratos civis, escassos os de compra e venda mas frequentes os de arrendamento por campo determinado, designadamente para aproveitamento da bolota.

No século XVIII, com Carlos III de Espanha e a “política campomanista” de fixação de ganadarias e desenvolvimento agrícola, com sua estratégia de cultivo, há um desaproveitamento pastoril das «dehesas», com perturbações sociais que vão desde 1761 até ao desaparecimento dos privilégios do «Honrado Concelho», a que sucede, em 1836, uma Associação Geral de Ganadeiros.

Nas conclusões a que chegou Filipe Leco Berrocal em face do estudo sobre as «dehesas» estremenhas, diz o investigador que é necessária uma gestão integrada e racional do ecossistema e dos respetivos recursos, impossível sem um conhecimento exaustivo sobre ele, em que possam assentar as atuações dos diferentes agentes, em ordem ao estabelecimento de um equilíbrio entre desenvolvimento económico e social e a conservação dos espaços, numa postura de gestão económica de desenvolvimento sustentado, «cientificamente factível, economicamente viável e ambientalmente desejável», tendo presente fatores e fomentando as cooperações entre responsáveis públicos e particulares, na proteção contra os riscos, desde as secas até aos incêndios.

O autor, responsabilizando as medidas pontuais, por ineficazes, aponta aspetos essenciais de uma política consequente para as «dehesas» que exige fontes estatísticas fiáveis, em que se inclui a teledeteção espacial, a ordenação conjunta e sincrónica dos vários elementos do sistema e (para além das questões de titularidade da exploração), se necessário, a exploração comunal ou cooperativa e o fomento em geral do associativismo agrícola, procurando-se a adequação das tendências económico-sociais aos usos tradicionais, desde a agricultura rotacional, ganadarias autóctones em regime extensivo, aproveitamentos agrícolas, cortiça, madeiras, medicinas, etc.

Neste plano, a questão não é tanto a de falta de um enquadramento legislativo das soluções, mas sobretudo a de saber até onde irão os níveis da sua execução pela Administração pública. Deve considerar-se correta, em face da função social da propriedade, a exigência de níveis mínimos de produtividade, e de respeito por técnicas culturais adotadas, aliás esforço acompanhado e incentivado. Com efeito, nos termos do artigo 1.º da Lei n.º 1/1986, de 2.5, as «dehesas» incluídas no respetivo registo administrativo merecem da Administração agrária regional a comprovação da produção efetiva em termos de ganadaria extensiva e a determinação da produção potencial, designadamente de cortiça (a obter em função de um índice de potencialidade produtiva, de difícil concretização sobretudo quanto à avaliação da incidência climática, devendo a carga ganadeira e a produção da cortiça atingir 80% da carga animal ou da produção potencial, sem o que o proprietário, ou supletivamente a própria Administração, devem elaborar, aprovar e por em execução um plano de aproveitamento e melhoramento, que especificará medidas e avaliará investimentos a fazer para as atingir. Tudo sob penalizações administrativas e tributárias correspondentes a situações de aproveitamento deficiente.

Os auxílios técnicos e económicos, constantes desde logo de empréstimos e subsídios, visam ajudar à unificação das diferentes titularidades dominiais, para potenciar o melhor aproveitamento das «dehesas».

Mas todas estas virtualidades têm aparecido na Extremadura como de aplicação e aproveitamento problemático (Filipe Leco Berrocal, o.c., sobretudo págs. 238 e seguintes).

Só o futuro poderá esclarecer até que ponto é possível «inverter certas evoluções negativas» nas situações dos montados mediterrânicos em geral. Em Portugal há legislação que pretende a sua defesa, através de medidas de interdição de atuações humanas dirigidas a várias espécies tratadas de modo isolado, desconhecendo-se a juridicamente a realidade ecossistémica em causa. Vejamos.

2.A PROTEÇAO DAS AZINHEIRAS E DOS SOBREIROS EM PORTUGAL

(Textos retirados de Condesso, F. -DIREITO DO URBANISMO.(...). Colaboração de Catarina Alexandra Condesso.Lisboa: Quid Juris, 1999, p.374 e ss.). A LEGISLAÇAO HOJE APLICÁVEL (A ATUALIZAR EM BREVE E QUE ENTRETANTO DEVE SER CONFERIDA PELOS ALUNOS PARA ATUALIZAÇAO DO ESTUDO) é o Decreto-lei n.º 169/2001, de 25 de Maio, alterado pelo Decreto-lei n.º 155/2004, de 30 de Junho, que estabelece medidas de protecção ao sobreiro e à azinheira.

Quanto às azinheiras, elas são muito importantes para as regiões onde se encontram implantadas, devido à sua influência nas condições ecológicas e climáticas e enriquecimento dos solos. O seu corte provoca alterações no regime das águas e modificações indesejáveis no clima junto ao solo, com agravamento da aridez de um meio já empobrecido. A legislação aplicável até 2001 ao condicionamento do corte de azinheiras era o Decreto-Lei n.º 14/77, de 6.1.

O arranque, corte ou poda de azinheiras dependem da autorização da Direcção-Geral das Florestas. A autorização para cortes rasos só poderá ser concedida desde que os serviços competentes do Ministério da Agricultura reconheçam a vantagem de utilização dos solos para outras culturas. São proibidos os arranques ou cortes de azinheiras que provoquem o abaixamento do coberto para além do limite inferior de densidade normal dos montados de azinho, correspondente a um arbóreo de 40%. Cortes rasos de azinheira poderão ser autorizados desde que seja reconhecida a vantagem de utilizar os solos para outras culturas.

***

Quanto aos montados de sobro, eles são áreas de grande valor (devido à indústria de cortiça, à criação e postos de trabalho, à diversidade dos produtos daí resultantes, etc.) que devem ser acauteladas. Só excecionalmente se autoriza o corte e arranque de sobreiros. A legislação aplicável até 2001 ao condicionamento do corte de oliveiras era o Decreto-Lei n.º 172/88, de 16.5, que condiciona o corte de montados de sobro.

Como se constitui a servidão? A entidade que pretenda realizar uma obra de utilidade pública, sendo necessário para isso um corte raso, deve apresentar à Direção-geral das Florestas prova fundamentada da imprescindibilidade dessas obras e da inexistência de alternativas válidas para a sua localização. Quando o corte tiver como justificação a conversão de culturas, a entidade interessada deve requerer autorização à Direcção-Geral das Florestas. Quanto às consequências da servidão, é proibido o corte ou arranque de sobreiros que não se encontrem secos, doentes, decrépitos ou dominados. Os cortes rasos de montados de sobro só podem efetuar-se quando visem a posterior ocupação do solo com obras imprescindíveis de utilidade pública ou uma conversão de cultura de comprovada vantagem para a economia nacional. Ficam vedadas por um período de dez anos (contados a partir de Maio 88) quaisquer conversões culturais em áreas que tenham sido atingidas por incêndio.